quinta-feira, 26 de maio de 2011

Resposta à Homofobia Cristã

Gostaria de fazer apenas algumas pequenas considerações a respeito da controvérsia que já dura tanto tempo, ora de forma mais intensa em forma de perseguições, inquisições, holocausto, pena de morte das maneiras mais variadas e desumanas possíveis, ora escamoteada pela falsa democracia como nos tempos atuais, aliás um retrocesso, se considerado os movimentos de liberação das décadas passadas. 
É fato que a família não teve a formação que atualmente conhecemos “a priori”, ao contrário passou por intensa transformação como indicam inúmeros estudos científicos. É fato que Deus não criou Adão e Eva no paraíso e, desta forma iniciou a forma de relacionamento conjugal perfeito que devesse perdurar “ad infinitum”.
A família, segundo Morgan “é o elemento ativo; nunca permanece estacionária, mas passa de uma forma inferior a uma forma superior, à medida que a sociedade evolui de um grau mais baixo para outro mais elevado. Os sistemas de parentesco, pelo contrário são passivos; só depois de longos intervalos, registram os progressos feitos pela família, e não sofrem uma modificação radical senão quando a família já se modificou radicalmente.”[1]
Este artigo é escrito, principalmente, sob a forma de uma revolta, por ter que reconhecer que o Estado, ao invés de laico, permanece sob a égide do cristianismo, que vez por outra remete-nos aos recônditos mais obscuros da Idade Média. Talvez isso, ainda, ocorra porque o povo brasileiro além de pouco esclarecido e educado em um sistema educacional falido – e não porque os professores sejam gays ou porque as crianças estão sendo educadas por casais homossexuais, mas sim porque neste sistema capitalista as questões humanas e afetivas são relegadas a segundo plano, nunca entram na pauta do dia – aliado a isto temos a TV aberta oferecendo como passatempo predileto, os reality shows, programações dominicais onde o que vigora são o bizarro e o culto ao corpo, quando não, a transmissão de campeonatos intermináveis de futebol, nada contra o esporte, mas – devo ressaltar que num país de analfabetos e miseráveis haverá uma copa do mundo que custaria, a princípio, R$ 17,5 bilhões aos cofres públicos, no entanto, em menos de 1 ano, essa previsão já saltou para R$ 23,5 bilhões[2] dos quais a maior parte será retirada do já tão exaurido erário da corrupção, propina, mensalão, etc – mas tudo isso atende à bem conhecida política “panem et circenses”, ou melhor – circo, porque o pão ficou para poucos.
Em relação à exegese bíblica, que parece ser o principal ponto de apoio dos respeitáveis senhores e senhoras contrários a qualquer lei que regulamente os direitos básicos e fundamentais dos homossexuais, onde faço mais uma ressalva, a de que poucos deles já tenham lido a bíblia de forma integral ou procurado conhecer o seu contexto histórico-social-filosófico. Bultmann afirmava não haver exegese sem pressupostos e Habermas não haver conhecimento desinteressado em nenhuma esfera da compreensão humana.
É impossível não reconhecer que a bíblia realmente toca na questão da homossexualidade, embora de forma culturalmente condicionada. O pensamento dos israelitas antes de entrar na terra prometida no 12° século A.C, influenciou profundamente o modo como o tema moral da sexualidade foi tratado ao longo de toda a história. Entre os hebreus não vigoravam tabus sexuais como os existentes nos dias atuais, como exemplo, as filhas de Ló que se deitavam com o próprio pai e a não proibição da poligamia. A maior preocupação da família nesse período era perpetuação da linhagem, por estarem vivendo em um meio hostil e estranho. “A tradição familiar era algo tão familiar era algo tão preciosa que Onã foi condenado por não querer gerar um filho e permitir que o sêmen caísse sobre a terra.” Daí advém a idéia de que a masturbação seja pecado[3].
A perpetuação da linhagem, a formação de novos guerreiros e a transferência do patrimônio sempre foram as grandes questões do velho testamento. “nossa cultura sexual foi moldada pela megalomania de querer que os descendentes de Abraão fossem mais numerosos que as estrelas do céu e as areias do mar. Todo ato sexual não reprodutor era crime punido com a morte[4].”
Outro fator relevante na interpretação da bíblia era a necessidade constante de opor-se aos costumes pagãos. “A rejeição à prática da homossexualidade, no início por razões sociais, passou mais tarde a ser exercitada como rejeição à vida dos opressores babilônicos, dos invasores medo-persas e dos romanos. Os israelitas não podiam ter as mesmas práticas dos goi. Desta forma a homosexualidade passa a ser vista, na cultura judaica, como algo essencialmente errado”.[5]
“Durante boa parte da história da igreja a inspiração era vista de forma mecânica, ou seja, acreditava-se que Deus tomava os escritores de tal forma que eles ficavam possuídos e transformados em uma espécie de instrumento. Em conseqüência disso, tudo o que escreviam era, literalmente livre de qualquer ingerência humana. A escolha das palavras, as idéias, tudo era divino e o homem entrava apenas com a mão e o papel[6].”
A partir do século XVIII com um maior estudo das interpretações da bíblia foi possível notar a existência de vários estilos literários e vocabulários diversos entre os livros, com isso surgiu o dilema que ou a bíblia não era inspirada por deus ou essa inspiração era diferente do modo como se imaginava. Desta forma surge a inspiração de forma dinâmica, em que deus inspiraria a idéia do autor, e este escolheria desde as palavras que usaria até o estilo literário em que escreveria. Para os teólogos ortodoxos esta forma de inspiração estava sujeita aos erros e enganos entre o pensar e o escrever, desta forma, acreditam na inspiração verbal-plenária, sendo a bíblia o registro inspirado da ação de deus entre nós.[7]
“O homem que apenas crê e não procura refletir se esquece de que é alguém constantemente exposto à dúvida, seu mais íntimo inimigo, pois onde a fé domina, ali também a dúvida está sempre à espreita. Para o homem que pensa, porém, a dúvida é sempre bem recebida, pois ela lhe serve de preciosíssimo degrau para um conhecimento mais perfeito e mais seguro[8].”


By: Vladimir Otávio de Souza


[1] ENGELS, Friederich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado; tradução de Leandro Konder – 15º ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.
[3] Centro de Estudos Anglicanos. Rev. Jorge Aquino. Reflexões sobre o Homossexualismo. (Compartilhar 26)
[4] Galileu, jan. 2004, p. 24
[5] Centro de Estudos Anglicanos. Op. Cit. p. 11.
[6] Centro de Estudos Anglicanos. Op. Cit. p. 4.
[7] Centro de Estudos Anglicanos. Op. Cit.
[8] JUNG, C. G. Interpretação psicológica do dogma da Trindade, 1979.  In: DOURLEY, J. P. A doença que somos nós – a crítica de Jung ao cristianismo. 2 ed. Trad. Roberto Girola. São Paulo: Paulus, 1987 (Coleção amor e psique).

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